Meu grande medo, meu grande temor, finalmente aconteceu o que eu menos queria. Estou grávida do meu ex-marido.Falou assim a irmã mais velha, apavorada por ter cometido um grave erro.Assim como a irmã mais nova tinha cometido tempos atrás.Não que um filho seja um erro, ele é sempre uma benção, mas a situação, a forma, o momento era. Os rapazes não as queriam para se casar, as queriam apenas para aquilo. E durante muito tempo elas aceitaram essa situação.Agora viviam juntas no mesmo apartamento e dividiam não só o mesmo teto como o mesmo destino.Uma cuidava da outra, ás vezes até competiam, se interessavam pela mesma coisa, até pelos mesmo homens.Mas nada, absolutamente nada prevalecia sobre o amor que sentiam uma pela outra.Juntas as duas sabem que não é preciso seguir os padrões para ser feliz.Juntas compreenderam a capacidade das pessoas em se descobrirem e se recriarem pelo caminho.
A irmã mais velha tem no currículo um curso frustrado de Arquitetura, largou antes de se formar, não foi até o final, nada ela ia até o final , nada.Mas esse filho ela ia ter, ah ia sim.Queria esse filho, queria senti-lo crescendo dentro de si.Mas queria o pai, o ex-marido, longe, bem longe deles, jamais revelaria para o filhe que ainda ia nascer quem era seu pai.A mobília do apartamento era toda do apartamento que a irmã mais nova usou quando morou junto com aquele outro rapaz.Móveis antigos, flores de plástico e anjos barrocos de gesso nas estantes dão um ar kitsch ao lugar.O tapete da porta é rosa, já foi amarelo.Elas adoram cores espalhafatosas. No lugar onde elas moram tudo fica deserto depois da meia-noite, a rua fica cheia apenas de cães famintos, gatos no cio e putas. A mais nova vendeu o carro que tinha, a mais velha divide o dela com a irmã mais nova.
Numa noite a irmã mais velha e a Irma mais nova beberam demais e vomitaram no banheiro. Uma cuidando da outra riam. E concordaram, bêbadas, que estavam as duas cansados de todas os homens do mundo, seus traumas, sua masculinidade babaca, suas vidas complicadas, suas exigências e cabrestos. E no meio de toda aquela risada veio o choro, porque concordavam, ás lágrimas, que estão felizes do jeito que estavam agora, sem um par, donas
de suas próprias vidas. Embora, rindo de novo, dissessem uma para a outra que talvez não soubessem o que fazer com elas.Mas um pacto foi firmado, elas continuariam juntas, mesmo com nascimento do filho da irmã mais velha.E a irmã mais nova iria trazer o seu filho para morar todo mundo junto.Seriam solteiras por opção, porque elas eram azuis e só as mulheres azuis fazem os homens felizes.
O vestido de noiva da irmã mais velha está no armário da irmã mais nova.A irmã mais velha não quis jogá-lo fora, o álbum de casamento também. Elas vivem usando a mesma roupa, têm quase o mesmo figurino, os pés são do mesmo tamanho. A irmã mais nova tem fixação pelos seus próprios pés, vive fotografando e capricha nos sapatos abertos.Se algum homem gostar de seus pés ganha muitos pontos com ela.A irmã mais velha adora seus seios, mas se pudesse colocaria silicone, para deixá-los ainda maiores e mais atraentes.Gosta do formato e da maneira que eles ornam-lhe o corpo.
A irmã mais velha pensa no ex-marido, agora também ex-amante, já não cai mais na armadilha que a ensinaram desde criança, príncipes encantados, acreditar que ela vai conseguir mudá-lo, que o cafajeste se tornará um herói romântico, afinal o amor redime a humanidade . Besteira! Ele não valhe nada e nem nunca valerá, ele que morra no meio de suas amantes brejeiras.
A irmã mais nova, apesar de mais nova, descobriu isso bem antes, por dentro ela é quente, quente como um sol de verão, mas que em contato com o mundo se congela e se esvazia de qualquer calor. Esfria, não que ela não seja quente na cama, isso é e muito, criativa, adora experimentar, já andou flertando com mulheres, mas ainda não teve coragem de ir para cama com uma delas.Talvez nem tenha, não é mais nenhuma adolescente.Acha que tudo isso é moda, fala pra si mesma que essa coisa de mulher ficar beijando outra na boca é coisa de revoltadinha, de quem quer chamar atenção, eu sou é hetero! Sou área e etérea! Mas ela não quer mais nada sério com ninguém, só quer diversão, curtir um tempo e depois já era, tchau.
O apartamento delas é incrível, na sala a televisão sempre ligada junto com o equipamento de som, ás vezes rádios, ás vezes CDs ou Mp3.Depois do trabalho ficam lá as duas pralá-pracá, nuas, falando sem parar, fumando e de cabelos molhados e envoltos na toalha em turbante parecendo indianas.O cheiro do perfume delas se mistura pelo ar, a mais velha gosta de perfumes amadeirados, a mais nova dos masculinos mesmo.Enquanto preparam o jantar, as irmãs sentam no computador, lêem emails e noticias, a irmã mais nova fica bastante tempo no celular.Quem tiver intimidades com alguma das duas descobrirá um mapa que as sardas nas costas delas desenham, aquelas lindas sardas feitas pelo sol de algum praia.
O vizinho do prédio ao lado é um velho tarado, taxista, casado, vive na sacada olhando, olhando, tentando pegar algum lance, tem um binóculo. A senhora dele nem desconfiava.Mas ele é fissurado nas irmãs e elas adoram se exibir pra ele, mas fingem que é tudo sem querer.Ficam se divertindo enquanto desfilam nuas, displicentes, se abaixam, fingem que estão pegando alguma coisa.Um dia elas ainda matam o velho do coração.Aliás a velha dele um dia desses o flagrou em plena masturbação enquanto olhava pra elas.Bateu nele com panela na cabeça.Elas se acabaram de rir na sala.
Quando conheci a irmã mais velha não tive a intenção de me apaixonar, mas bastou uma mera distração e já era.E fiquei como a sensação de que uma lua inteira tinha entrado dentro de mim.Primeiro fomos colegas, depois ficamos amigos.Foi no mesmo dia em que ela me convidou para ir ao seu apartamento e na mesma noite em que conheci também a irmã mais nova.E ela com aquele olhar de nuvem baixa me arrebatou logo de cara.
Ainda bem que tenho dois olhos, com o direito olho para a irmã mais nova e com o da esquerda para a mais velha. Pena eu ter um só coração.