Desejo não é pecado

“Amor é o desejo irresistível de ser irresistivelmente desejado.” (*Robert Frost)

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Cio da fera


A mulher é mais um das forças da natureza, torna-se a quinta estação da terra quando sente em suas veias o anseio irrefreável de se dar a alguém. Primavera, flores no cabelo, outono, fruta madura e sumarenta, inverno, fogo queimando debaixo do edredom, Verão, transparência íntima das suas curvas vertiginosas. A quinta estação é o seu desejo ancestral ardendo, nada é capaz de detê-la na sua ânsia de amar e ser amada impiedosamente, com toda essa energia acumulada, ela explode condensando todos os outros estados do tempo, do tempo chuva ou sol ou do tempo anos e horas, dentro de si. A mulher é um portal para o homem, para levá-lo a outra dimensão.
Porque qualquer homem, mesmo o mais simples diante de tanto poder, torna-se um guerreiro, um general de espada em riste, um semideus que com seus raios é capaz de derrubar as muralhas do castelo das errâncias ou de destronar os exércitos de sua solidão, qualquer homem comum diante do cio dessa fera ganha a força de mil Hércules para levá-la ao êxtase profundo de um gozo capaz de derreter qualquer galáxia. E uma mulher satisfeita tem a mesma fidelidade dos pássaros migradores, pois voltará sempre voando para escapar do frio e se aquecer na chama do coração desse homem, simples e comum, que ela transformou em herói.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Vou festejar, o teu sofrer


Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima
(Carlos Drummond de Andrade)

Dizem que o ódio é algo ruim, porém no fundo todo mundo odeia alguém sim, talvez pela projeção de achar que o inferno sempre são os outros. Mas para a traição não há outro remédio senão o ódio, não aquele ódio, a dor que fere ou que mata, mas aquele ódio que é a raiva desatando em satisfação por ver o sofrimento do traidor penando por outra mão. O castigo nem precisa vir pela sua destra, mas que venha de um jeito ou de outro sublimando a reparação pelos danos causados. Mesmo sendo um sentimento menor, é humano sentir ódio das pessoas que te machucam. Porque não haverá perdão sem primeiro haver ódio. Insensato seria querer prejudicar ou destruir, não precisa de nada disso não. O vingador não será você e sim o próprio traidor. Não há melhor lugar do que assistir de camarote a queda de quem você amou e te pagou com traição. E se isso parece cruel, mais desumano seria sentir pena ou sentir dó. A pessoa lá de joelhos,implorando, chorando, se humilhando e você só desprezar.  
Aqui se faz, aqui se paga, antes da piedade, ou do perdão, é preciso atender ao imponderável clamor de justiça, não pela vingança, mas pela certeza que aquilo que nos fez mal ao coração, cedo ou tarde terá  seu justo remédio, encontrará  a sua merecida cura ou achará sua sagrada solução.


Vou Festejar
Beth Carvalho

Chora!
Não vou ligar
Não vou ligar!
Chegou a hora
Vais me pagar
Pode chorar
Pode chorar
Mas chora!
Chora!
Não vou ligar
Não vou ligar!
Chegou a hora
Vais me pagar
Pode chorar
Pode chorar...
É, o teu castigo
Brigou comigo
Sem ter porquê
Eu vou festejar
Vou festejar!
O teu sofrer
O teu penar...
Você pagou com traição
A quem sempre
Lhe deu a mão
Mas chora!
Chora!
Não vou ligar
Chegou a hora
Vais me pagar
Pode chorar
Pode chorar 

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A casa de Maresias – Parte X


A psicóloga sobre o arquiteto

Ficamos lá olhando na mesma direção do mar em silêncio muito tempo. Naquele dia o mar estava muito calmo, a noite caia e já dava para ouvir um grilo fazendo o seu cri-cri.Não queríamos voltar para nossa casa.
O meu marido, o arquiteto, sempre soube me fazer sorrir e chorar na mesma intensidade.Antes dele eu era uma menina, depois cresci ao seu lado, nos casamos cedo e nosso amor foi esmaecendo, nunca desapareceu por completo, mas foi ficando cada vez mais apagado.O desejo, a chama dele, também mantivemos acessa, embora ela também tenha ido se apagando.O arquiteto foi capaz dos melhores e piores atos que um homem pode ter com uma mulher, mas eu sempre o perdoei, porque afinal, além de pai das minhas filhas, como meu marido ele me fez mulher em todos os sentidos e um homem que faz isso com uma mulher, o perdão é uma benção concedida como gratidão.O problema é que para ter chegado nesse nível, hoje em dia somos muito mais amigos do que amados.
Teve uma vez que reencontrei um amigo, na verdade um cara que sempre tentou se envolver comigo, mas eu nunca quis, nunca me senti atraída por ele, mas vira e mexe acontecem essas coisas, surgem pessoas, vindas do passado ou então outras que eu esbarro no presente.Esse cara me perguntou se eu ainda estava casada, eu disse que sim, ele riu, disse ainda?, eu disse ainda, mas quando eu disse ainda me assustei porque esse ainda foi um ainda que demonstrava que eu já tinha dúvidas sobre querer continuar casada ou não.Ele me chamou pra sair, eu disse que não, embora quase tenha dito que sim.Não nasci para ser infiel, embora tenha cometido duas infidelidades.As duas com gosto de arrependimento, mas muito mais pela violência contra mim do que contra o meu relacionamento.A primeira foi fraqueza, mas a segunda traição foi por vingança mesmo.
Eu me vinguei porque sabia de todas as sujeiras do meu marido, porque tinha descoberto um caso que ele estava tendo com a secretária. A minha experiência profissional nesse ponto é uma benção e uma maldição.Benção porque para me enganar é um pouco mais difícil, sendo psicóloga eu sou observadora, e maldição porque não consigo se tapada, alienada e me fingir de morta.Só de ter visto ela me atender quando foi a companhia percebi logo de cara que tinha alguma coisa de estranho acontecendo.E pela cara do meu marido, pelo jeito dele sem graça quando me viu olhando pra ela tive a confirmação do caso dos dois.Mas quase duas décadas de casamento te deixam cínica e irônica, jamais revelei pra ele que sabia.Por isso o traí.
E traí com um paciente, já que ele me traiu com sua secretaria. Um paciente que eu tratava já de muitos anos.Um homem mais novo do que eu, não muito, só dez anos.Sempre houve na nossa relação uma certa simpatia além, eu gostava da maneira como ele falava de si mesmo, de seus progressos e de suas mudanças.E notava a maneira como ele olhava pra mim.Então foi flexibilizando as coisas.Antes nos cumprimentávamos com um aperto de mãos antes das sessões.Passei a abraçá-lo e depois até a dar um beijo em cada face.Notei que ele gostou dessa mudança, no inicio deve ter achado estranho, mas depois gostou.Passei a usar sandálias abertas, exibindo meus pés, a usar roupas mais ousadas, decotes, saias.Guardava elas todas só pra ele, no meu armário do consultório, porque com os outros pacientes era séria, seriíssima.E o paciente foi ficando excitado.Então num golpe final, uma certa vez deixei a caneta cair do lado do divã.Ele fez menção de pegar, mas eu me abaixei para pegá-la e fingi que escorreguei e caí em cima dele.Desculpa, disse com olhos de gata, com boca de pantera, meio sem graça, meio sorrindo, ele percebeu, por um instante era ele a ler meus pensamentos.E nos beijamos e fizemos amor ali mesmo, em cima do divã, eu na posição submissa, de quatro, e ele matando todo seu desejo de anos e anos de análise comigo.
 Não sei mais como confiar em meus sentimentos, estou confusa, parece que estou na beira do precipício, meus pés tropeçando nas pedras que rolam e se espatifam lá embaixo.Eu não amo mais meu marido, só estamos juntos por causa das crianças, mas não sei até quando vou suportar tudo isso.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Iniciação


A primeira mulher que vi nua na minha vida foi a Xuxa.Ela estava lá peladinha numa revista chamada “Status” que acidentalmente descobri embaixo da cama dos meus pais(estava “encaixada” entre o entrado e o colchão).Era agosto de 1981, eu tinha só sete anos de idade e ainda me lembro da sensação que tive, do cheiro das páginas da revista e das fotos dela semi-vestida de marinheira e fazendo poses com cintas-liga como se fosse a Marilyn Monroe que eu ainda nem conhecia.Acho que aquela experiência foi decisiva na minha vida, uma descoberta que não dividi com ninguém na época, mas que me deixou fascinado pelas mulheres e pela sensação boa que elas me faziam sentir com a visão de seu corpo.
Eu ainda não tinha idade para entender exatamente, mas me lembro que senti uma sensação boa. A mesma que com o passar dos anos fui compreendendo que sentia quando olhava para as pernas, seios e coxas das meninas da minha idade, das moças mais velhas e até das mulheres da idade da minha mãe.O sexo sempre foi algo muito bem resolvido na minha cabeça, mesmo estando em contato com os inúmeros absurdos que os garotos inventavam, com o pudor que a família, a sociedade e a igreja dão a ele como um ato de luxúria ou pecado.Fiquei constrangido, mas com nenhum trauma nem mesmo quando fui flagrado me masturbando pela minha mãe bem no inicio da adolescência.A descoberta do corpo pelo menino é sempre um ato emocionante, cheio de adrenalina e curiosidade.Alguns dos limites impostos pela sociedade, até mesmo a moral quando ela não é hipócrita, são bons para o nosso bom desenvolvimento emocional, ruim é o exagero, a repressão, o corpo pode ser ao mesmo tempo: templo, trabalho e prazer.
A primeira vez que vi um filme que continha imagens de nudez foi “Pretty Baby”, com a Brooke Shields onde ela interpretava uma criança que vivia em um bordel e que atuava em várias cenas de nudez com apenas doze anos, a mesma idade que eu tinha na época.Também vi por acidente porque acordei de madrugada e o filme estava passando, assisti escondido com o coração aos pulos.Depois eu e um amigo no inicio da era do videocassete gravamos clandestinamente na madrugada “A lagoa Azul”.Hoje o filme passa na “Sessão da Tarde”, mas na época nossos pais nos proibiam de assistir.Programamos o videocassete da casa dele que gravou “tudinho” para o nosso deleite na manhã seguinte quando ele me ligou confirmando que o nosso plano tinha dado certo.Depois veio “Endlesse Love”, o “Amor sem fim” que também tinha Brooke Shields numa das histórias de amor mais belas já contadas no cinema, na época comecei a entender que sexo e amor podiam vir juntos dentro de uma relação.
Na “vida real” a minha iniciação sexual foi tardia, um pouco pela minha timidez de menino criado intensamente pela mãe, e outro tanto pela minha não simpatia pela prostituição. Foi tardia pelos padrões porque bem cedo aprendi que sexo também é uma maneira de manifestação política, porque enseja em si um ato de liberdade e de sentimentos, um padrão de conduta, um conhecimento dos limites e o respeito pelo meu corpo e a admiração por todos os tipos físicos e de personalidade. O sexo me salvou de ser preconceituoso e me tornou mais humano.
E naquela minha inocência de 17 para 18 anos uma moça surgiu pelas bandas de onde eu morava, éramos colegas porque estudávamos na mesma sala, apesar de termos a mesma idade, ela era bem mais experiente do que eu, enquanto durante toda a adolescência eu fui um garoto platônico, ela já tinha namorado homens mais velhos e sua iniciação sexual se iniciou aos 13 anos. Ela nem sabia quando se aproximou de mim da minha condição de virgem, carioca que é, ela tinha um jeito de ser expansivo e liberal, me chamou para ir para a praia num domingo, final de tarde.Sem saber, e por incrível que pareça, inocentemente, eu não sabia que ela tinha planos.Fomos nadar juntos na água do mar, era dezembro a água estava gelada.Ela sorria e brincava comigo, vire e mexe se enroscava no meu corpo e se roçava em mim.Notando a minha timidez  foi mais além, tirou a parte de cima do biquíni,nadou pra longe de mim e me chamou.E quanto mais perto eu chegava, mas pra longe ela fugia.Ela deu a volta no meu raio de ação e saiu da água, sentou na areia com os seios de fora, e de lá fez sinal pra mim com as mãos e disse: “Vem me pegar, vem!”.Comigo foi ao contrário, eu é que fui seduzido por uma mulher.O que começamos na praia terminamos na rede da varanda da minha casa.A noite já feita  e eu me tornando homem no inicio dos anos 90, meu coração quase saindo pela boca, uma paixão avassaladora nascendo, o muro de Berlin dentro de mim sendo derrubado, enquanto os caras pintadas estavam indo para as ruas para pedir a queda do Collor. E eu que era menino, agora como homem, estava suando de prazer pela primeira vez. Era a minha estréia no mundo que começava a se globalizar, minha inserção naquela juventude que eu assistia pela televisão na MTV, foi logo naquela época que eu aprendi a amar as pessoas como se não houvesse amanhã, e o sexo que começou proibido,  quando foi finalmente descoberto, me entregou para a máquina do mundo para ser devorado ou para devorar.Um grão de areia no meio do furacão.
O desejo não é só um sentimento, ele é muito mais do que isso, ele é uma força, uma força impossível de ser detida.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Janelas indiscretas

Do apartamento dele dá pra ver tudo que acontece no apartamento dela. O seu melhor programa de sábado a noite é vê-la se movimentando como voyeur nato que é.Apaga as luzes da sala, pega o binóculo e se senta numa poltrona que comprou exclusivamente para isso.E ela anda pelo apartamento à noite no verão sufocante. Parece que não consegue dormir, talvez porque sua calma queima, ou será ela a queimar os lençóis? Prende os cabelos num rabo de cavalo e refresca a nuca. Ele ajeita-se melhor na poltrona. Ela vai ao quarto, escancara a janela e puxa as cortinas. Respira fundo procurando um frescor, mas o ar está parado. O ventilador de teto em sua sala deve estar soprando o hálito do dragão. Ela vai à cozinha, abre a geladeira e se esfria rodando o próprio corpo ente a porta e as prateleiras, na esperança de se sentir melhor. Pega a garrafa d'água e passa pelo rosto, pelo pulso, pelo peito. Nem o chão ladrilhado parece estar fresco. Seus pés descalços sentem o morno do chão castigado pelo sol durante o dia e que agora guarda a lembrança desse dia de verão. Ele se levanta rápido para buscar um copo de coca-cola na geladeira, também sentindo o calor escaldante daquela noite que parecia ter ao invés da lua brilhando no céu, um pequeno sol cintilando e esquentando a cidade.
Na sala, ela abre a porta de vidro que dá para a varanda, onde se apóia e espera pelo movimento dos galhos da árvore ao lado do seu apartamento, que não vem. Suas coxas estão suadas e ela se lembra de uma outra noite, em que suas coxas ficaram assim, quentes e molhadas, mas não era verão e ela não estava sozinha. Ela sente a sensualidade invadir seu pensamento. Anda até a área de serviço, fica olhando as estrelas no céu. Resolve se molhar na torneira do tanque. Ali a água está mais fresca. Ele já encontrou com ela pessoalmente outras vezes.Na padaria, no supermercado.E ela nem desconfia.Já trocaram até um oi na rua outro dia.
Ela coloca a cabeça debaixo da torneira molhando os cabelos, o rosto, o pescoço. Depois sacode os cabelos deixando a água escorrer pelo corpo. Sua camisola fica encharcada. Ela fica parada por alguns minutos saboreando o momento, depois arranca a roupa e joga-a dentro do tanque. Ele quase vai ao êxtase, com os olhos grudados no binóculo saboreia cada pedaço de seu corpo e sente o gozo do voyeur. Olhar pelo prazer de ver.
E ela então nua e molhada  se deita na cama e finalmente dorme.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

A casa de Maresias - Parte XIX


O arquiteto sobre a psicóloga

Eu gosto das suas tranças, os anos passam e eu ainda me lembro da primeira vez que eu a vi com aquelas grandes tranças loiras, dançando reggae, ainda tão menina, mas já tão cheia de si.Não sei em que ponto nós nos deixamos de amar, o tempo deveria ter um efeito diferente desse de consumir, essa coisa terrível que é o desgastar.Mas eu ainda a admiro, ainda olho pra ela e consigo sentir uma sensação diferente.Sabe, inventei uma coluna que geralmente uso em jardins de invernos, é feita de concreto, é como uma transa estilizada por onde a água deve escorrer quando chove.Meus clientes adoram essa minha idéia.Ela é inspirada nas tranças dela.
Quando ela ficou grávida da Clarice estava linda, eu adorava ficar olhando pra ela sem que ela percebesse, dizia pra mim mesmo, “poxa isso tudo é meu?” E quando ela percebia, me falava com um daqueles mil sorrisos que ela tem “para de ficar me olhando!”, mas era um “para” que queria dizer mesmo é “continua me olhando e nunca mais pare!”. E é isso que eu faço até hoje, até hoje eu ainda continuo olhando para minha esposa sem parar. Mesmo quando ela do meu lado está usando seus inefáveis óculos escuros que escondem aqueles grandes olhos italianos. Eu teria sido um imbecil se não tivesse me casado com ela.
Sabe a minha profissão é algo que eu gosto muito, pensar que faço parte da vidas das pessoas, que desenho suas casas, o lugar onde muitas delas vão viver para a vida toda, puxa isso é algo maravilhoso pra mim, é o que me faz encarar cada dia como se fosse um desafio.Ser arquiteto é uma mistura de arte com obrigação, obrigação de crescer profissionalmente, de construir espaços para o convívio particular ou público e de construir uma sociedade feliz.Ou pelo menos tentar.Assim como faz a minha esposa, ela tenta fazer as pessoas se construírem melhor, minha esposa, a psicóloga, uma mulher incrível, mas que já não sei se amo mais.Eu me culpo, rapaz, como eu me culpo por te deixado de amá-la, mas pelo menos me congratulo quando sinto que a admiro.E acredito que vou admirá-la mesmo se nos separarmos.Toda vez que descemos juntos para a Casa de Maresias eu fico olhando pra ela e pergunto: “No que você está pensando?” e quase sempre ela me diz: nada.E eu sempre soube que não era nada, sempre soube que ela estava pensando na gente, desde o começo eu sempre senti ela pensando na gente.E não é fácil você construir uma família e sentir que sua esposa talvez não seja feliz com você.
Eu dei minhas mancadas, eu a traí algumas vezes. Tive casos com secretárias e casos com mulheres do meu meio, arquitetas e engenheiras da minha companhia.E minha esposa, a psicóloga, deve ter descoberto algum desses afairs.Mas um casamento que chega a quase duas décadas, pelo menos o nosso, não teria sobrevivido de outra maneira.Eu não saberia bancar o bonzinho o tempo todo, tem horas que preciso dar essas escorregadas.Já perdi minha aliança uma vez num quarto de motel cafona da Vila Mariana, um motel com quartos temáticos, cama giratória e espelhos por todos os lados.A mulher era uma arquiteta, casada também.Flertávamos desde quando ainda éramos jovens recém-formados.Uma noite, já lá pelas tantas, cansados e trabalhando no mesmo projeto saímos pra jantar e relaxar.  Aí aconteceu. Já tive que passar uma semana sem ficar sem camisa em casa por causa dos arranhões que ganhei de uma secretária. Ela tinha fetiche, queria transar na prancheta, queria transar em cima da mesa, no chão, dentro dos armários, era um furacão. Foi um caso que durou alguns meses.Paramos só quando eu comecei a ficar preocupado com as atitudes dela, apaixonada ela podia querer me prejudicar.Então fizemos um acordo, eu a demitiria e daria uma indenização.Ela disse, garota ainda, você não pode comprar o meu amor, eu respondi que não poderia mesmo, mas a convenci que seria melhor para nós dois daquele jeito, porque eu não largaria minha família por causa dela.
Meus casos são como anexos, variações do meu desejo, no meu conjunto de valores a minha infidelidade não é uma traição, não chego a amar essas fêmeas, elas são isso fêmeas, entidades femininas com um nome. Apenas sacio minha fome em corpos voluptuosos de mulheres que se oferecem como frutas sumarentas, por isso mordo suas cascas, preciso comê-las as polpas, chupá-las até o bagaço, mas sempre cuspo fora as suas sementes.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

A casa de Maresias - Capitulo VIII


Clarice

Com a descoberta de sua sexualidade Clarice resolve explorar suas possibilidades de sedução. E a sua proximidade com o pai e o seu fascínio por ele a fazem querer seduzir um homem da mesma idade que ele. Num das festas dadas pelos pais na casa de Maresias, ela bebe sedutoramente do copo de um homem mais velho para sentir o gosto do que ele bebe. Mordia os lábios olhando pra ele, se insinuava andando pra lá e pra cá, passando despercebida e sorrindo juvenilmente pros pais para que eles não desconfiassem de suas intenções. Usa, inconscientemente, um artifício mágico que muita mulher experiente sequer conhece, levanta os braços e exibe as axilas raspadas. O amigo do pai gosta, enquanto bebericava seu uísque , disfarçadamente inicia uma aproximação com ela.Sua esposa já está bêbada e conversa animadamente com a psicóloga e com outra amiga do casal.O arquiteto está na outra varanda conversando com outro amigo, provavelmente sobre a construção de algum dos prédios que está envolvido. Ninguém percebe mais os dois flertam. Eles se afastam discretamente da sala, vão para a varanda da frente.O homem mais velho parece excitado e Clarice gosta do que sente, daquele perigo , daquela adrenalina de atrair um homem mais velho.Os dois conversam, ela de saia curta se senta de pernas cruzadas na poltrona revelando os joelhos redondinhos de curvas mais doces que pêssegos maduros.E o homem mais velho foi ficando maluco com aquela boca rosa, com os cabelos que pareciam um milharam ondulante quando o vento vindo da praia batia.Foi buscar mais gelo, certificou-se que ninguém estava prestando atenção neles, mas gelou quando notou um certo olhar da esposa que mesmo bêbada parecia querer saber o que ele estava fazendo. – Meu amor vou ali levar gelo para todos. Disse fazendo força para parecer natural e não despertar desconfianças.A psicóloga nem sonhava que a filha estava na varanda da frente esperando pelo homem mais velho.Ele voltou com mais gelo, deu mais alguns golinhos pra ela e marcou um encontro com Clarice para mais tarde, na praia, quando todos estivessem dormindo, porque naquele momento era perigoso demais.Mesmo assim ela, safadinha, segurou num dos braços dele sedutoramente, como uma onça filhote, como uma cria de águia que estava aprendendo a caçar, - não quer nem experimentar antes?. Um misto de medo e loucura percorreu a espinha do homem mais velho, que não pensou duas vezes e beijou a boca de Clarice.Na pontinha da língua a menina estava aprendendo como se filtra o mel que embebedava aquele velho colibri, como se destila um veneno para enlouquecer aquele vampiro que pensava que beijando uma virgem estava tornando seu corpo mais jovem e sua masculinidade ainda mais viril.O beijo foi rápido e intenso, deixou o homem mais velho atordoado e trêmulo.Clarice sorria, achava graça na reação dele.Provou pela primeira vez aquela sensação louca que reúne em si nojo e desejo, desprezo e admiração. O homem mais velho, assustado, logo foi ao encontro dos outros na outra varanda, para se safar e para não despertar suspeitas.O abate da ninfeta, da Lolita da casa de Maresias ficava pra mais tarde.
Depois que todos dormiram Clarice pulou a janela, ele saiu de fininho, a mulher bêbada roncava no quarto, ele seguia seu instinto de macho confiante. A ninfeta Clarice já estava sentada na areia, num ponto da praia onde já tinha estado com garotos, e fingiu não perceber a aproximação do homem mais velho, o vampiro avelhantado de cabelos brancos, barba mal feita e com cheiro de cigarro na boca.E ele lhe mordeu o pescoço, ela ficou arrepiada de virar os olhos, ele foi descendo pelas costas, mordia de ficar marca, quase tira um pedaço dela.Clarice parecia gostar daquela selvageria porque só estava acostumada com os garotos ainda tímidos e inexperientes que pouco sabiam daquela loucura toda de homem mais velho.Rolavam na areia, se roçando e quase se engolindo.Clarice, a ninfeta da casa de Maresias, ficava com os olhos semi-abertos, a boa entreaberta respirava em gemidos como se fosse uma cadelinha no primeiro cio, e o homem mais velho parecia estar se refestelando com aquela carne nova, aquela cabrita que ele devorava em banquete, e uma de suas sobrancelhas arqueava de perversidade, como se ele fosse um lobo-mau devorando a chapeuzinho vermelho. Ele, colibri encanecido, mordia o ombro dela, babava em seu pescoço, sua nuca tinha a tinta nova raspada pela barba mal feita dele, o homem mais velho. Ele se sentiu poderoso ao ver o corpo nu da ninfeta, queria possuí-la, queria beber de seu corpo a juventude.
E ela deixou o homem mais velho sugar seu corpo todo, principalmente os seios pelos quais ele tinha fixação, mas ela não se entregou totalmente a ele, não quis perder a virgindade com aquele bode velho, queria é só diversão, o homem mais velho, o vampiro de cabelos brancos, o colibri de asas cansadas, ficou zangado, mas ela retrucou imediatamente, na verdade já tinha um plano para escapar de suas garras mesmo antes, se você forçar eu grito e todo mundo vai ouvir.Com medo, o vampiro homem, o bode mais velho, se conformou em gozar nas coxas dela.E o liquido dele escorreu viscoso pelas pernas dela.Ela lavou tudo no mar e voltou para a casa pulando de volta janela do quarto onde ainda haviam bichinhos de pelúcia.

A casa de Maresias - Capitulo VII


Lorena

A filha Lorena cresceu menos mimada, porém mais retraída.Dentro dela desde pequena cresce um sentimento de ciúmes da irmã com o pai.Parece ser muito mais uma questão de afinidade entre eles, Clarice parece que combina com o pai, mas Lorena se ressente disso, embora só tenha se dado conta na adolescência.Por isso sua irmã é sua maior rival.
Clarice sempre teve os cabelos mais cumpridos, os de Lorena sempre foram mais curtos. A psicóloga percebeu muito cedo essa diferença entre suas filhas, e nunca se opôs a ela, pelo contrário, permitiu que elas se distinguissem uma da outra, permitindo que suas identidades fossem se formando de maneiras distintas e por isso elas desde cedo usavam roupas de estilos diferentes. A Lorena sempre se perdia dos pais, uma vez num supermercado, outra no parque de diversões e outra no estacionamento do shopping. Talvez fosse uma maneira de chamar a atenção.De que sentissem sua falta e que valorizassem sua existência.
Na escola Clarice sempre era a mais popular, já Lorena uma das mais estudiosas.Clarice era namoradeira, já Lorena não, dificilmente se encantava por algum garoto.Mas teve uma vez que se encantou por um.Paixão platônica.Ela e o menino da carteira da frente eram muito amigos, amigos de estudarem juntos, de estarem na mesma turma, e por isso ela se interessou por ele.Principalmente porque ele era inteligente e estudioso igualzinho ela.Na escola sentava ele na frente dela.Foram ficando muito amigos ao longo dos anos que estudaram juntos.Mas ela nunca contou pra ele, tinha medo de que ele risse da cara dela, que a achasse ridícula.Aliás ninguém nunca soube, era um segredo que ela guardava com ela.Escrevia um diário que tinha ganho da mãe psicóloga, ele tinha chaves para ninguém abrir.Bastou um descuido e Clarice conseguiu ler seu segredo.E maldosamente espalhou para escola inteira.A noite as duas brigaram feio, foram as vias de fato mesmo, se estapearam, puxaram o cabelo uma da outra, um ódio terrível veio a tona, era como se elas quisessem matar uma  a outra.Foi preciso a intervenção da empregada Maria, do Pai Arquiteto e da Mãe psicóloga para que as duas parassem de brigar.E cada uma ficou confinada ao seu quarto, ficaram de castigo por um mês sem poder sair de casa.Aquilo chocou um pouco aos pais, a psicóloga e o Arquiteto ficaram meio perdidos com aquela situação.Foi precisa muita conversa para que elas se reconciliassem.Mas foi tudo encenação.Lorena prometeu secretamente a si mesma que iria se vingar da irmã.Ao contrário do que ela pensava, o menino da carteira da frente ficou encantado em saber que sua melhor amiga era apaixonada por ele.
Lorena foi concebida pela psicóloga numa noite de amor com o Arquiteto no quarto da esquerda na casa de Maresias, noite em que chovia torrencialmente e que o som do mar bravio entrava pelas janelas. A luz tinha acabado e eles acenderam umas velas. Ficaram conversando, de mãos dadas na penumbra.O arquiteto sempre foi bom em massagens e a psicóloga tinha uma dor constante nos músculos lombares. Ele usou suas mãos grandes, mas muito leves, que desenhavam em pranchetas, para tocar suas costas em movimentos circulares. Com as pontas dos dedos ele massageava os nódulos e os tendões.Ela virava os olhos de alivio da tensão e de tesão mesmo.Aos poucos ele foi descendo até quase o bumbum, depois voltava até quase a nuca.A psicóloga foi ficando louca de desejo.Mas ele não parou por aí, intensificou os “requintes de crueldade” e começo a esfregar seu peito nas costas dela.E os grossos pêlos do peito dele iam friccionando na fina pele das costa dela, ela começou a se encaixar no corpo dele até que aquela massagem fosse se tornando uma sacanagem.Mas uma sacanagem amorosa, sim isso é possível, um desejo libidinoso, selvagem e louco, mas ao mesmo tempo carinhoso.Naquela noite, a luz de velas, eles começaram assim de costas, mas a psicóloga estava ferina e teve vontade de mudar de posição.Montou em cima dele e passou ela a comandar as ações.Movimentando os quadris freneticamente e com as duas mãos no peito dele arranhando.Olhos nos olhos, pedia para ele segurar em seus seios, para que chupasse um de cada vez, alternando a língua nos bicos, ora o esquerdo, ora o direito.Depois pediu para que ele puxasse seus cabelos, sem dó.E foi assim que alçaram o êxtase, ela gozou primeiro , depois ele a engravidando de Lorena.
No baile de debutante de Lorena ela dançou com o menino da carteira da frente. Depois da maldade da irmã tudo se encaixou entre eles. Os dois estavam apaixonados, viviam trocando emails e se falavam no MSN o tempo todo. Mas ainda não tinha rolado nem um beijo. Ocupados com a festança em todas dependências da casa de Maresias, os pais não viram quando ela beijou o menino da carteira da frente pela primeira vez, ali perto dos balanços que ficavam no fundo da casa.Foi um momento de amor num dos lugares da casa que tinha muita história, mas a menina nem sabia.
Apesar de Clarice ser a filha mais bonita, Lorena tinha seus encantos, era mais introspectiva, estava aprendendo a tocar piano, gostava de ir ao consultório da mãe para ficar estudando numa sala ao lado. Por isso as duas foram desenvolvendo uma afinidade entre elas. Lorena não tem a inocência perdida como Clarice, ela cultiva ideais românticos, embora não se deixe infantilizar como a maioria das mulheres faz, a eterna espera pelo príncipe encantado, inexistente.

Índice


"As mulheres são livros, e os pés são o índice."
Nelson Rodrigues

Não sei exatamente quando esse meu gosto pelos pés femininos se iniciou, só sei que hoje os pés de uma mulher são poderosos indutores do meu desejo. O estado dos calcanhares, as curvas, os dedos, as unhas e o sapato que ela calça. É mais do que um simples fetiche, ou um parcialismo, é pelos pés que uma mulher começa, como um índice que indica as surpresas, os mistérios e os prazeres que estão lá em seu corpo.
É um voyeurismo que pratico todos os dias, basta ver os pés de uma mulher para imaginá-la nua, pode ser uma indecência, um indecoro, mas que eu posso guardar somente comigo, vejo os pés e sinto a sua nudez em plenitude, os dedos são o indicativo do bico dos seios e a cor dos pés ,da pele oculta pelas roupas.Os pés são uma arma, um poder feminino sobre nós homens. Na Grécia, quando o segundo dedo do pé era o mais longo, simbolizava os poderes masculinos das deusas. As deusas virgens sempre eram representadas cobrindo seus pés para proteger sua castidade, pois eles eram considerados partes extremamente íntimas. A exposição deles era entendida como equivalente a uma proposta indecorosa.
A moral é os bons costumes são driblados pelos pés femininos, porque os pés de uma mulher são naturalmente obscenos, expõe a mulher todinha, são o indicativo de seus recantos mais íntimos e isso hoje em dia é normal, principalmente nesse verão escaldante, onde você for poderá ver a profusão de pés em sandálias abertas. A indecência liberada, estará onde quer que haja uma mulher a expor ingenuamente seus lindos pezinhos.
Há no meu desejo por pés além do desejo, um carinho, um respeito, como se fosse eu aquele que procura a princesa que perdeu seu sapatinho de cristal ao descer as escadarias do palácio, e que seja eu ao encontrá-lo que possa beijá-los acariciá-los, e que eu seja como Neruda, porque quando não posso contemplar teu rosto, contemplo os teus pés. E se amo os teus pés 
é só porque andaram sobre a terra e sobre o vento e sobre a água, até me encontrarem. 

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

A casa de Maresias - Parte VI



O encontro

A psicóloga conheceu o arquiteto lá em Maresias, na época deles tinha um bar da moda que todo mundo gostava de freqüentar. Os jovens vinham de São Paulo descendo a serra já pensando na azaração, nas bebedeiras e na diversão do lugar.A turma do arquiteto estava quase todos os finais de semana por lá.Praticavam o surfe e a praia sempre foi um dos melhores lugares do país para se surfar.E ele tinha casa naquele paraíso.Já a psicóloga vivia numa família repressiva e só conseguia sair quando os dois irmãos mais velhos do que ela a convidavam pra ir.Foi num final de semana desses que eles juntaram uma turma legal e alugaram uma casa praia.
A casa era bem precária, tinha goteiras, os carros atolavam na garagem, tinham baratas saindo dos ralos, as lâmpadas todas queimadas e nem tinha cama suficiente pra todo mundo.Mas naquela época ninguém ligava pra conforto, todo mundo queria era diversão, e o que poderia parecer um programa de índio logo se transformava em entretenimento.Então saia todo mundo matando as baratas, as meninas se uniam para afzer uma faxina na casa e os rapazes iam dando um jeito nos “defeitos” da casa.No final dava tudo certo e todo mundo se divertia saudavelmente.
A turma era legal, além dos irmãos dela e das namoradas, tinha outras moças e outros rapazes, mais ou menos umas quinze pessoas numa casa onde cabia no máximo oito. Apesar do status de “casa na praia” na verdade a casa ficava bem longe da praia, todo mundo tinha que ir de carro pra poder chegar até ela. Durante o dia todo mundo começava espremido debaixo dos guarda-sóis para se proteger do sol abrasador de janeiro no Litoral Norte, mas a medida que tomava-se caipinha e bebia-se cerveja, rolava um relaxamento total,alguns se aventuravam a dar voltinhas pela praia, outros jogavam frescobol e tinha ainda aqueles que iam formando uma rodinha de conversa na água do mar onde se falava animadamente sobre os mais variados assuntos.O resultado é que de noite antes de tomar banho estava quase todo mundo com insolação.E comprava-se tubos e tubos de um creme que aliviava as queimaduras do sol.
Quando chegava a noite, mais ou menos lá pelas onze e meia, era a hora do grande evento, o bar Shaolin era o grande bar da moda na praia naqueles anos.Um bar que começou como um quiosque e que de fato durante o dia era um quiosque, mas a noite se transformava em balada.A juventude dançava e bebia literalmente com o pé na areia porque a areia era o piso do lugar envolta do bar. E tinha música, geralmente era um Dj que escolhia a trilha sonora com estilos como a surf music ou Reggae, tocava bandas como o Australian Crown , Midnight Oil, Peter Tosh, Yellow Man, Bob e Zig Marley.Naquela década foi o surgimento da influencia baiana na Música Popular Brasileira, e a Daniela Mercury estava em alta e fazendo muito sucesso.A mulherada turma da psicóloga adorava e faziam até coro com a música da baiana. “Lágrimas nos olhos, de cortar cebola.Você é tão bonita.Você traz a coca-cola eu tomo.Você bota a mesa, eu como, eu como.Eu como, eu como, eu como...você! Você não está entendendo.Quase nada do que eu digo.Eu quero ir-me embora.Eu quero é dar o fora.E quero que você venha comigo...todo dia, todo dia!
E essa influencia dos tambores baianos também atingia o que a moçada bebia.Uma bebida chamada “capeta” era moda.Um monte de coisa misturado com água de coco que dava um “fogo” absurdo. Na casa alugada quando se aproximava a hora de todo sair, a bagunça se instalava. Era uma mistura de perfumes, uma algazarra da mulherada experimentando brinco uma da outra, vestido, colar.O visual era sempre naquele estilo mais hippie, saias indianas longas e coloridas, muitos brincos, colares e sandálias rasteiras. Do lado dos homens tudo mais sossegado, alguns faziam churrasco ouvindo Jorge Benjor ou Tim Maia, outros bebiam cerveja enquanto outros ficavam roncando no sofá e até mesmo no chão.O pessoal só ia tomar banho bem em cima da hora.A roupa era simples, era só usar um desodorante, algumas gotinhas de perfume, colocar uma bermuda, pendurar uma camisa no pescoço e calçar um chinelo.E pronto, estavam todos prontos pra night.
Enquanto isso na Casa de Maresias o Arquiteto e seus amigos surfistas bebiam wisky com pedras de gelo feitas de água de coco. Sentados na varanda ao som, bem alto, de Bob Marley, comendo churrasco preparado pelo caseiro e pela sua esposa que era uma espécie de empregada da casa.Dois deles fumavam maconha nos fundos e riam a beça um da cara do outro.A casa de Maresias nesses finais de semana era território livre para as transgressões daqueles jovens.Já tinha até um quartinho preparado para tanto.Quem conseguisse descolar sua gata podia usá-lo.
No Shaolin naquela noite de janeiro a lua brilhava soberana sobre o oceano atlântico de Maresias e suas ondas iluminadas por esse luar, de tão brancas pareciam neve.A música que tocava naquele momento, unidade indivisível do tempo, era “You are me sunshine” , todos dançavam animadamente naquele passo do Reggae, onde se levanta uma perna de cada vez com um salto no ar, sem esquecer dos braços balançando no ritmo, o jogo de luzes projetava as cores amarelas, azuis e vermelhas em todo mundo.A psicóloga estava com um vestido longo, cor de creme, tranças em seus cabelos loiros, o arquiteto estava de bermuda amarela.Em a música alta e dançante, ou a bebida fazendo efeito, e nem porque cada estava dançando um numa turma diferente impediu que eles se conhecessem.
Seus irmãos eram ciumentos e bravos, mas estavam ocupados demais com as respectivas namoradas para prestar atenção na irmã. Foi naquele momento, unidade indivisível do tempo, que o Arquiteto viu uma moça de pele branca, grandes tranças loiras e de vestido creme sorrindo.Tinham várias outras moças lindas em toda parte.Mas aquela em especial, no meio de todas aquelas beldades, foi que lhe chamou atenção, naquele momento.E ele foi lá, movido pela bebida e pela atração, dançar pertinho dela.A psicóloga estranhou, mas depois achou engraçado aquele marmanjo de caracóis nos cabelos dançando e fazendo graça perto dela.E sorriu.E quando ela sorriu ele sorriu também porque sentiu que bateu, bateu algo entre eles.Não disseram uma palavra, só ficaram lá se olhando e rindo.A música terminou, as amigas dela a puxaram e ele sem graça voltou pra sua turma que ficou tirando sarro da cara dele como se aquilo tivesse sido um fora.Mas não foi.
Não foi porque a psicóloga não tirava mais o olho dele, disfarçava, mas tinha se sentido atraída pelo cara de cabelos com caracóis.E ele do seu lado também tinha ficado interessado pela moça de grandes tranças loiras.E quando ela foi ao banheiro ela a seguiu.Conversaram, com um “oi”, os dois riam sem parar.E o papo foi curto, com frases como “eu te achei linda”, “obrigada, são seus olhos”, “ você vem sempre aqui?”, “adoro o Shaolin”, “meus irmãos são ciumentos podem nos ver juntos”, “vamos pra praia, tem uma lua linda brilhando lá”, “você dança bem reggae”, “queria te beijar”, “não sei se devo”, “deve,  você vai adorar”. E bem debaixo de um pé de abricó, que aliás ainda está lá, foi que eles se beijaram.

A casa de Maresias - Parte V


As meninas

O arquiteto estava cercado por três mulheres fortes e geniosas. A mais nova Lorena sentia ciúmes da proximidade da irmã Clarice com ele. Isso a revoltava, a deixava chateada. Já Clarice lutava com a mãe pelo poder de forma velada. Não a obedecia.Freqüentemente usava roupas decotadas demais e tinha uma tendência se tornar promíscua embora guardasse em si ainda um certo pudor.A mãe, a psicóloga, se sentia muitas vezes infeliz dentro daquele casamento.Vive um conflito interno entre sua parte Amélia, influenciada  pela mãe de família italiana, e sua parte libertária influenciada pelo pai.A convivência dessas três mulheres se intensificava na casa de Maresias quando durante o verão passavam alguns meses juntas.Clarice desde muito cedo tinha criado um estilo próprio, muito vaidosa e independente, dispersa, ativa, extremamente extrovertida e que fazia amizades facilmente.Já Lorena era mais retraída, mais obediente e concentrada.Parecia sempre muito focada nos seus objetivos e suas amizades eram bem poucas.
A psicóloga justamente por ser psicóloga tentou criá-las de uma maneira perfeita, segundo o que aprendeu na faculdade e da observação da vida prática e de seus pacientes. Tentou não interferir em suas personalidades e sempre buscou ser compreensiva. Mas nem sempre teve muito tempo pra isso, sua carreira logo cedo deslanchou, ela trabalhou muito anos numa empresa em que prestava consultoria e depois abriu seu próprio consultório.Apesar de pouco tempo com as filhas sempre foi uma mãe muito presente.Sempre que possível comparecia as reuniões, ligava para elas durante o dia e a noite sempre conversava com as crianças durante o jantar.Faziam as lições de casa juntas e aos finais de semana o tempo todo estava por perto.
Desde quando as meninas eram pequenas sempre houve alguém para cuidar delas enquanto seus pais trabalhavam. Naquela época eles não queriam babás, a prima Rita, prima da psicóloga, foi a primeira que cuidou delas.A prima Rita era uma mocinha ainda quando ajudou a psicóloga cuidar da Clarice bebê.As duas avós ajudaram bastante também, mas foi a prima Rita que segurou a barra.Vinda do interior, a prima Rita quase tinha virado freira, e só não virou pra cuidar da Clarice.Prima Rita é dessas mulheres que só riem, pra ela estava sempre tudo bem, tudo bom, nada a chateava, nunca ninguém a viu de mau humor ou contrariada.Quando Lorena nasceu a prima Rita ainda estava lá.Na casa de Maresias foi ela quem organizou os murais de foto e uma espécie de exposição de desenhos infantis das irmãs desde quando elas ainda eram crianças em idade pré-escolar.Os desenhos que ficavam pendurados na porta da geladeira do apartamento de Perdizes eram cuidadosamente transportados por ela para casa de Maresias onde ela num dos quartos organizava nas paredes uma exposição.O lado “C” era o de Clarice e o lado “L” o de Lorena.Prima foi embora quando as meninas cresceram e passaram a estudar quase que o dia todo.Virou freira.
Na casa de Maresias cada uma tinha seu quarto. O quarto de Clarice estava sempre bagunçado, o de Lorena um pouco mais organizado.Cada uma tinha suas bonecas e seus brinquedos separados em São Paulo, mas na casa de Maresias tudo se misturava.O lugar preferido da casa das meninas, quando ainda eram pequenas, eram os dois balanços que o avó, pai da Psicóloga, tinha feito pra elas no fundo da casa.Eles eram feito de cordas vermelhas, um assento era branquinho o outro azul.O azul era o de Clarice, o branquinho de Lorena.Ficavam dependurados no galho de uma velha árvore que parecia estar lá mesmo antes da construção da casa.Fora preservada pelo outro avô, o pai do Arquiteto.As duas passavam lá horas se balançando cada vez mais alto, cada vez mais alto.E a prima Rita paciente que só ela, balançou muitas vezes as meninas até quase sua completa exaustão.
Quando as meninas foram uma vez numa feira de animais adoraram um pintinho e fizeram o Arquiteto comprá-lo e o levaram para casa. Chegando lá a psicóloga quase pirou, brava interpelou o Arquiteto e as filhas: “Onde já se viu criar um pintinho em apartamento?”. E ela estava certa porque o pintinho foi crescendo no apartamento até um dia que a bagunça que ele fazia e o cheiro de seus excrementos não davam mais para ser tolerados na lavanderia do apartamento em Perdizes. E o pintinho foi morar lá na casa de Maresias perto do muro dos fundos, do lado da casa do caseiro. Depois veio o Ralf, um cachorrinho da raça Labrador simpático, que as meninas ganharam de um amigo do pai do Arquiteto.Enquanto ele era pequenininho tudo bem, era uma gracinha, mesmo quando fazia cocô e xixi no chão do quarto das meninas, mas teve um dia que ele rasgou o sofá branco da sala de estar que era o xodó da psicóloga.Ela surtou e despachou ele para a casa de Maresias no final de semana seguinte.E o cãozinho foi morar num canil que o caseiro construiu especialmente pra ele lá.Teve ainda um porquinho-da-índia, o Tuti, que também foi morar na casa de Maresias porque vivia fugindo e freqüentemente era encontrado no banheiro da psicóloga que tomava susto todas as manhãs com ele porque o confundia com um rato.
Lorena desde pequena se adaptava facilmente a casa de Maresias, dormia tranqüila e calma.Já Clarice demorava alguns dias para se aclimatar ao calor da praia.As duas adoravam brincar na areia e aprenderam a nadar bem cedo na piscina da casa.No mar se deixassem, passavam o dia todo brincando bem na beirinha, já que o mar de Maresias é bem bravo.Clarice desde pequena gostava de fazer castelos, já Lorena gostava de fazer buracos.As duas sempre brincavam juntas, mas Clarice sempre quis comandar as brincadeiras.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

A casa de Maresias - Parte IV


A psicologia 

A psicóloga ia para a praia com a família desde que era um bebezinho, sua primeira experiência com o mar foi quando ainda tinha três meses de vida, seus pais a levaram para se banhar nas ondas brancas do oceano atlântico após descer a Tamoios por algumas horas. E ela parecia gostar porque gritava de agitação com a água fria e seus irmãos naquela algazarra doida em volta dela. A psicóloga era filha de um pai comerciante vindo do interior, Itu, e de mãe italiana da Mooca. Eram quatro filhos, todos homens, só ela de mulher.Nascida numa casa quase que inteiramente masculina teve que se virar desde cedo para garantir seu espaço entre os homens.Enquanto que os três dormiam todos nos mesmo quarto, seu pai fazia questão de manter um quarto só pra ela, dizia “mulher tem que ser protegida”.E aquele carinho do pai com ela, aquela sensação de cuidado a acompanha pela vida toda.Caso contrário teria crescido insegura desde a infância.Por ser mulher e ter sido criada junto com um monte de homens aprendeu as vivências dos dois lados.Mas sua mãe sempre foi uma mulher que a cobrava demais, era mais ligada ao filhos homens, pegava demais no pé dela, exigindo muito moral e psicologicamente da psicóloga .Algumas dessas cobranças a fizeram buscar compensações na vida adulta.Sua conduta amorosa, por causa de alguns déficits de afetividade com a mãe, poderia ter sido uma sucessão de tentativas frustradas de estabilização emocional.Sorte a dela ter encontrado logo o Arquiteto.
Porém antes de conhecê-lo teve um relacionamento sério, namorou durante uma época um rapaz que ainda morava com sua antiga esposa. Ele dizia que morava com ela ainda só por causa do aluguel que eles dividiam. Foi um relacionamento conturbado, ela ainda muito jovem teve que enfrentar uma barra bem pesada. O cara era um tremendo de um Pilantra e enganou ela direitinho. Estava casado e a mulher sabia das suas pilantragens, mas não conseguia largá-lo.A psicóloga  na época não era mais ingênua, sabia que aquele homem não valia nada, mas se sentia atraída por ele.O pilantra tinha um tipo “bad boy”, cara de sem-vergonha mesmo, barba quase sempre por fazer,sempre sem camisa ou de camisa aberta, esses tipos que muita mulher gosta porque acha que homem tem que ser malandro e ter cara de mau. Perdeu a virgindade com o pilantra aos dezesseis anos.Naquela época estava louca para “pertencer” mesmo a alguém.E ele apareceu na época do seu no segundo colegial, quando começava a sair e ir para festas.O Pilantra a conheceu numa dessas festinhas de bairro.Ele tinha um carro envenenado, rebaixado, vidros fumês e som possante.Aquele aparato todo seduzia as menininhas de bairro em Itu.Ficavam todas suspirando por ele quando passava pela porta das casas que organizavam aquelas festinhas juvenis.Imagina o Pilantra tinha quase quarenta anos e ficava rondando feito tubarão aquelas ninfetinhas de quinze e dezesseis anos louco para “papá-las” todinhas.
E numa noite quando a futura psicóloga tinha bebido demais, tomou coragem e  aceitou dar uma volta com ele pelo quarteirão. Mas o que era um quarteirão foi pela cidade toda. Pediu um beijo e ela deu, pediu mais, porém ela pediu um tempo para se preparar.E o pilantra certo que tinha abatido uma nova preza esperou paciente.Esperou até um sábado que ela precisava fazer uma visita a avó que vivia na Mooca em São Paulo.Falou para os pais que ia de ônibus, mas foi com ele.E se entregou pro pilantra num motel da Marginal do Tietê. Até hoje quando ela passa por ali ainda dá um sorrisinho de canto de boca. Porque doeu muito, doeu pra caramba! Ela devia ter um estreitamento vaginal, ou então um hímen demasiado resistente. Porque o Pilantra apesar de toda banca que botava, não era tão bem dotado assim. Mas não falaram dessas coisas e tudo foi se ajeitando, até que a dor foi aos poucos sendo substituída pelo prazer.
Seu caso com o Pilantra durou alguns meses , a esposa do Pilantra chegou até a virar amiga dela como uma tentativa desesperada, ou uma falta de auto-estima absurda.Na cabeça dela ficando amiga da rival elas poderiam juntas tramar contra o Pilantra uma espécie de revanche, de plano para destruí-lo, e que ele destruído a ninfeta cairia fora e ela, a esposa, ficaria com seus restos porque ela o amava de qualquer maneira.
O Pilantra vivendo nos melhores do mundos, vendo sua esposa se aliar a sua amante-ninfeta, teve o desplante de propor que os três fossem pra cama juntos.A psicóloga quase aceitou, mas foi a esposa do Pilantra que indignada com aquela situação ameaçou contar pra família toda dela o que estava acontecendo se ela não se afastasse de seu marido.Com medo das conseqüências a psicóloga colocou ponto final naquele relacionamento.O Pilantra ainda tentou, mas ela percebeu que aquilo era mesmo besteira e que não sentia mais vontade de se aventurar daquela maneira.Há relatos que em Itu até hoje existe um Pilantra, agora com quase sessenta, caçando ninfetinhas.E ainda está casado com a mesma mulher.
Pouco tempo depois a família da psicóloga se mudou para São Paulo, o irmão mais velho iria se casar, o segundo estava se formando, ela iria terminar o colegial num colégio mais forte e o caçula iria tratar de uma doença pulmonar crônica que tinha desde que nasceu. Foram morar na Mooca juntos com os pais de sua mãe e mais repressão a psicóloga sofreu, porque eram todos moralistas e reacionários naquela família.
Seu pai tinha falido em Itú, esse já era o terceiro negocio dele que não dava certo, as ele nunca desistia.Tomou um empréstimo com um amigo e começou um novo negócio nas vizinhanças.No inicio todos ajudavam, até o irmão mais velho que iria se casar com uma advogada filha de homens ricos, estava lá dando sua mão-de-obra.A mãe era uma lutadora, mulher que falava alto, que fazia amizades fácil, mas que era extremamente controladora.No fundo era ela quem mandava em todo mundo.Já seu pai era um sujeito calmo, ponderado, parecia até mesmo calcular as palavras que iria falar.E a psicóloga era apaixonada pela maneira de ser de seu pai, porque foi ele que sempre abriu as portas do mundo para ela.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

A casa de Maresias – Parte III


A arquitetura

O arquiteto veio de uma família abastada, nunca soube o que era dificuldade na vida. Dentro da família que havia constituído apesar de ser o grande provedor, tinha que se conformar de estar à sombra das duas filhas e da esposa. No fundo ele gostava de desfrutar do domínio que elas exercem sobre ele. Já a sua relação com seu próprio pai, Arquiteto também, era de admiração e de ódio. Admiração pela forma como seu pai havia construído a vida.Mais ou menos mesmo como um bom prédio,reforçada estrutura, alicerce forte, boas colunas e pé direito alto.Ainda na faculdade de Arquitetura, foi se erguendo, erguendo até que conseguiu construir uma empresa sólida.O ódio vinha da profunda humilhação que sofria quando seu pai dizia que ele não era um homem de verdade, era apenas uma imitação, um arremedo.Apesar de nunca ter dito, ele sabia que seu pai tinha certeza que o filho não tinha os mesmos princípios morais que os seus.Que não era um sujeito resignado como ele era.E que não tinha o mesmo caráter e disposição para ser firme diante das tentações da vida.Seu pai desde os tempos de faculdade o advertia sobre suas falhas, sobre sua maneira de lidar com a vida de maneira tão superficial.
Como se você não tivesse jamais cometido erros, sua vida não é perfeita como s prédios que projetou pai.Tiveram essa conversa na varanda da casa em Maresias uma vez.O pai ficou sem falar com alguns meses.Não gostou de ter ouvido o que o que o filho arquiteto sentia por dentro, encarou como um insulto, como uma ofensa e não um desabafo.A verdade é que a vida do pai do arquiteto e a sua se parecem em alguns detalhes, como se família fosse ao mesmo tempo uma herança maldita e abençoada.
A mãe do arquiteto foi sempre mãe do inicio ao fim. Uma mulher que hoje em dia parece pertencer não só a outro tempo, mas a outra dimensão.Nascida numa família também de mulheres, a mãe do arquiteto tinha outras duas irmãs.E dentre as três ela foi a única que se casou, as outras duas ficaram cuidando da mãe do pai até que eles morressem já velhinhos.Ela era de um tempo que mulheres não estudavam ou então se dedicavam a serem interessantes para que fossem desposadas por um homem que valesse a pena.Pois ela foi contrária e rebelde a tudo isso.
Estudou a contragosto dos pais, foi morar na casa de uma tia que a ajudou até conseguir passar para a universidade.Foi lá que conheceu o pai do arquiteto, amor a primeira vista, coisa de cinema mesmo.No pátio ele olhou para ela uma vez e depois não conseguia mais tirar seus olhos jovens dela.Ela por sua vez, de gênio forte, fingia não estar sendo observada, mas parecia gostar daquela corte visual que estava recebendo do distinto rapaz.
O pai do arquiteto não resistiu, e ainda na primeira semana das aulas estabeleceu contato com ela. Primeiro conversavam sempre, depois eram visto sempre juntos. E no próximo passo passaram a fazer parte do mesmo grupo de estudos.Numa tarde ele sem querer tocou nas mãos dela.A mãe do arquiteto sentiu algo estranho, uma sensação de medo e de prazer ao mesmo tempo.De noite antes de dormir e depois de fazer suas orações, teve a certeza que ele era o homem de sua vida.
Numa aula de desenho, o pai do arquiteto fez um esboço, uma espécie de caricatura com as formas, com a face sorrindo, e com os cabelos esvoaçantes de uma mulher.Tirou nota máxima pela obra.E no dia seguinte o entregou a mãe do arquiteto com uma dedicatória simples: Querida , obrigado pela inspiração.A mãe do arquiteto ficou vermelha como uma pimenta.E ele sorrindo de longe notou que aquela era a mulher de sua vida.Esse desenho está até hoje na sala de jantar da casa em Maresias.
O primeiro beijo deles foi num aniversário de um amigo em comum.O pai do arquiteto pediu a honra de uma dança.E foi naquela dança, de mãos coladas e de olhos fixos um no outro que a magia entre eles tomou forma.Ao final da música, o bolero “Tú Me Acostumbraste”, os dois de olhos fechados uniram seus lábios pela primeira vez.
O namoro começou já no dia seguinte, ele queria falar com os pais dela, mas ela mesmo nem falava com eles já tinha muito tempo.Falou com a tia mesmo dela que consentiu com muito bom gosto.Ficou orgulhosa da sobrinha e dizendo ser o moço um bom partido, um moreno educado e cheiroso, segundo suas palavras já amareladas pelo tempo.Mas mesmo com a simpatia da tia, o pai do arquiteto nãos se deu por satisfeito e promoveu a reconciliação da filha com os pais.Neste mesmo dia pediu permissão para namorá-la.Os pais dela no inicio não concordaram.Foram precisas muitas visita e paciência para que então aos poucos ele fosse aceito por eles.
Porém, ele e a mãe do arquiteto tiveram uma noite de amor antes do casamento, foi por causa do vinho de um jantar de confraternização ainda no segundo ano da universidade. E foi naquela noite que um filho foi concebido. Grávida a mãe do arquiteto teve que abandonar a universidade.Foi uma pequena morte pra ela no começo, mais depois novamente uma alegria poder ser mãe pela primeira vez.
Casaram-se com ela grávida de três meses, a barriga nem aparecia, e felizes contraíram o matrimônio numa velha Igreja na Avenida Ibirapuera.Mas antes que a gravidez terminasse a mãe do arquiteto teve complicações e acabou perdendo o bebê antes que ele nascesse.Arrasados eles passaram maus bocados juntos chorando todas as noites na primeira casa em que viveram na Freguesia do Ó.A dor só aumentou ainda mais a união entre os dois.
Só depois que seu marido se formou e quando ele já tinha uma empresa constituída é que ela engravidou do Arquiteto. Passou a gravidez toda indo todos os dias a igreja pedindo proteção para seu bebê e que ele nascesse saudável.
E assim nasceu o Arquiteto.

A casa de Maresias – Parte II

Jussara

A família passava as tarde de sol entre banhos de mar, castelos de areia, guarda-sóis, livros e grandes copos de caipirinha. As noites na casa de Maresias eram sempre movimentadas, outros casais vinham visitá-los, amigos de São Paulo que também passavam as férias de verão por lá. As festas eram regadas a muita cerveja e música.As meninas já adolescentes ficavam logo entediadas e como tinham a sua turma saiam logo para as baladas.Na verdade pequenos barzinhos perto da praia repletos de adolescentes barulhentos e hiperativos como elas.
A casa contava com alguns empregados, duas moças que cuidavam da arrumação dos quartos e eventualmente ficavam até mais tarde para ajudar a preparar comes e bebes também. Uma terceira trabalhava como cozinheira. Além do caseiro Silvio que morava na casa dos fundos e cuidava da piscina, dos jardins e de toda conservação, manutenção e segurança do imóvel. Só as paredes da casa de Maresias sabiam que o casamento desgastado era bonito por fora como a fachada da casa, mas muito frágil e não tão sólido por dentro.Os dois já chegando aos quarenta, apesar de jovens e bonitos, lutavam para se sentir desejáveis.
Clarice é uma menina precoce, vive um conflito velado com a mãe psicóloga que parece sentir ciúmes do pai com ela. A mãe se sente incomodada com a relação tão próxima deles. Do fato dela ainda se sentar no colo do pai, da maneira com ela a beija ou dá um tapinha no bumbum da filha. Mas a malícia só está na cabeça dela.Clarice descobre na casa em Maresias toda a sua sexualidade.Com o mesmo João que deu o primeiro beijo perde a virgindade. Aos dezesseis se sente mulher e não mais menina.
Por detrás do sorriso alegre do pai, o Arquiteto, se esconde um homem triste, apesar do sucesso profissional ele se sente fracassado como marido.Vive tentando resgatar seu casamento com a mulher, mas não sabe muito bem como fazer.Já teve alguns casos, inclusive trouxe uma delas, Berenice, para a casa em Maresias.Foi quando a mulher e os filhos viajaram para a Flórida nas férias de Julho.Um outro segredo da casa de Maresias.O caseiro Silvio fingiu que não viu.O arquiteto depois do final de semana deixou cem reais debaixo da porta dele.Silvio entendeu o recado.
Os gêmeos Mauro e Murilo viviam tentando chamar a atenção, queriam conquistar seu espaço e a consideração dos pais nessa família cheia de conflitos ocultos e que eles ainda não entendiam. O casal trabalhava demais e pouco participava da educação dos dois. Era a babá Jussara que cuidava deles.Jussara ainda com seus dezoito anos tinha vindo do interior de Minas, da cidade de Monte Carmelo, direto para São Paulo.No inicio foi um choque pra ela ter saído de uma cidade pequena e pacata com quinze anos para uma metrópole como São Paulo.Sua tia Maria trabalhava com a família do casal por mais de vinte anos e quando a baba antiga pediu demissão depois que ficou grávida ela indicou sua sobrinha.A menina sempre falava que queria sair da casa dos pais para conhecer o “mundo”.Mas o que encontrou era bem maior do que sua cabeça imaginava.Cuidar dos gêmeos não era fácil, eles tinha uma natureza bastante indócil, pareciam sempre irritados, mas aos poucos elas foi se adaptando a eles e conquistando a confiança e o gosto da patroa, a psicóloga.Até então nunca tinha namorado, aliás, Jussara era virgem quando chegou a São Paulo.A psicóloga sugeriu que ela estudasse para terminar o ensino médio que ela havia abandonado algum tempo antes.Matriculada num curso supletivo conheceu muitos rapazes e esses rapazes se interessaram por ela.O primeiro, foi Hercílio, trabalhador da construção civil.Mataram aula, tomaram cervejas no bar da esquina da escola noturna.Por nunca ter bebido Jussara ficou logo bêbada.O rapaz reparando que ela estava “tonta” a convenceu a ir ao seu apartamento, duas quadras dali só.Na verdade era uma república daqueles que trabalhavam na construção de um prédio.Hercílio foi cuidadoso com ela, não deixou ninguém se aproximar, trancou a porta para ter privacidade.
Ele mesmo nem reparou que ela era virgem, depois de alguns beijos a penetrou, mesmo sendo homem bruto, foi com carinho, porque ela era “branquinha” e isso pra ele inspirava cuidados.Quase não saiu sangue.Jussara mesmo “tonta” sabia exatamente o que estava fazendo.E gostou muito.Tanto que depois conheceu Gilson.Com ele foi num domingo, dia de sua folga.Estudaram nos banquinhos para uma prova de matemática.Mas as pernas de Jussara foram enlouquecendo aquele homem, que mesmo sendo casado, transou com ela atrás das árvores o lá no Parque do Carmo.Depois foi a vez do Wellington, moço tímido, mas que foi seduzido por ela.Welligton era ajudante de jardineiro do prédio onde Jussara morava como babá.Enquanto levava os gêmeos para brincar no playground, ficava paquerando o rapaz.Um dia enquanto Murilo e Mauro corriam no gramado resolveu se aproximar e puxar papo.Mesmo tímido o rapaz retribui.Dia após dia, ela com a calma de uma raposa, foi se aproximando do cara.Até que veio umas férias dos gêmeos.Naquele final de ano o arquiteto e a psicóloga iriam levar a família toda para passar o natal e o ano novo em Nova Iorque. Então deram férias para todos empregados, sua tia Maria e ela podiam viajar para Monte Carmelo e passar as festas com a família.Mas Jussara não quis, preferiu ficar em São Paulo mesmo, “fazer o quê lá naquele fim de mundo”, pensou.A verdade é que queria mesmo Wellington.
Sozinha naquele imenso apartamento que mais se parecia um palacete, conseguiu atrair o rapaz para lá. Passariam a noite de natal juntos. Ele subiu pelas escadas até o décimo - oitavo andar, por causa das câmeras nos elevadores. Jussara vestiu as roupas da patroa, a psicóloga, seus brincos, seus colares, seu tamanco e um vestido de seda. Usou sua calcinha, seu sutiã, seu perfume, seu xampu e até seu esmalte. Transou com Wellington na mesma calma que a Psicóloga e o Arquiteto faziam amor e pediu que o ajudante de jardineiro usasse a mesma cueca e o mesmo roupão que seu patrão, o Arquiteto usava.

A casa de Maresias – Parte I


Saindo de São Paulo aquele trânsito infernal, parecia que a cidade inteirinha estava descendo para o litoral,“efeito manada” dizia o pai arquiteto.Na rodovia Ayrton Senna eles sempre paravam no mesmo posto.Abastecimento, banheiro e sanduíches era o script, a mãe psicóloga ia com as meninas Lorena e Clarice ao toalete feminino enquanto o pai levava os gêmeos, Mauro e Murilo, para fazer xixi.Lorena com seus treze anos e Clarice já com dezesseis.Viajavam na confortável camionete do pai, cabine dupla, espaçosa, abrigava todo mundo com sobras, ar condicionado e bancos de couro.Além dos filhos a babá Jussara também estava com eles.
Na rodovia dos Tamoios os quatro ficavam nas janelas olhando o mar lá embaixo enquanto o pai ia contornando a serra do mar.A mãe, um pouco alheia, lia um livro.A relação do casal era razoável, já tinham passado por muitas crises, mas o casamento sobreviveu em grande parte, é verdade, por causa das crianças e pelo patrimônio.E também por ela ser psicóloga e  ter aprendido a se resignar, a renunciar um pouco as frescuras.Aprendeu com a mãe, filha de italianos, que “mulher ás vezes tem que ser surda e só abrir a boca se for para dizer coisas sábias”.Ela não era tão Amélia assim, mas tentava.Já ele era durão, mas tentava ser sensível.
As férias na praia para aquela família paulistana era um grande evento que marcaria para sempre a vida dos seis. Ficavam sempre numa casa que tinha sido dos pais dele, o arquiteto. Aliás, o arquiteto era filho de um arquiteto também, por isso a casa era toda planejada, um sobrado angular, cheio de vidros nas arandelas e amplas varandas. Na praia de Maresias essa foi uma das primeiras mansões construídas ainda nos anos 70. A casa foi sendo reformada ao longo dos anos, mas guardava ainda em seus corredores, varandas e amplos quartos, velhas histórias. O arquiteto passou muitos verões com os amigos da faculdade lá. Deu muitas festas, experimentou drogas e sua iniciação sexual foi no quintal dos fundos com uma moça chamada Flávia.
Os gêmeos vieram depois que a psicóloga tentou engravidar várias vezes, foram concebidos por fertilização assistida. A primeira filha não, Clarice foi um susto, ela engravidou naquela mesma casa, dezesseis verões passados, não estava tomando remédios e por terem bebido demais esqueceram do preservativo. O resultado foi que ela engravidou aos vinte e dois, sorte que já tinha terminado a faculdade e ele também. Os pais dos dois, chocados, então apressaram o casamento. Casaram rápido, menos de seis meses depois. A festa foi na casa de Maresias, recepção para 120 convidados. Já Lorena nasceu quando eles ainda se amavam, também concedida no quarto da esquerda da casa de Maresias.
É nessa praia que muitas experiências importantes acontecem pela primeira vez: beijos, paixões, traições, drogas, baladas, bebedeiras. Clarice beijou pela primeira vez João na boate, tinha só 12 anos. Murilo quebrou o dedinho do pé após topar na pedra mineira da piscina. Lorena menstruou pela primeira vez aos doze anos quando se preparava para ir para a praia.Mauro deu seus primeiros passos na varanda.A mãe, a psicóloga, certa vez veio sozinha de férias fora da temporada, em setembro, para a casa.Em crise no casamento, acabou se envolvendo com um empresário.Saíram para jantar algumas vezes, mas ela não teve coragem de ir pra cama com ele.Ficou arrependida, chorou muito olhando para ondas brancas.Só a casa é testemunha de seu segredo.Ela beijou o empresário na boca muitas vezes, em uma semana que estiveram envolvidos ela chegou a pensar que o amava.
Nesses dias de férias em que a família acaba passando mais tempo juntos é que os conflitos ficam mais nítidos, coisas que não aparecem na rotina deles do dia-a-dia do apartamento nas Perdizes. As meninas vivem brigando, parecem que competem, os gêmeos não param quietos, aprontam o tempo todo, davam muito trabalho para a babá Jussara.A babá com seus dezoito anos andava dando mole pro motorista de uma mansão ao lado.Seu quarto ficava na ala externa da casa e isso lhe dava uma certa liberdade.De noite depois que fazia os gêmeos dormir, sai de fininho e ia conversar com ele.Não demorou muito já estavam transando no quartinho de madrugada, todas as noites.